A Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM) “condena a aviltante realidade imposta aos doentes face à falta de vagas para internamento de agudos no Centro de Responsabilidade Integrada de Psiquiatria do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC)”.
Em comunicado enviado hoje à CentroTV, o SRCOM, adianta que “segundo os relatos que chegaram à Ordem dos Médicos, há inclusivamente doentes com critérios para internamento compulsivo e que permanecem vários dias no Serviço de Urgência, tornando-se caótica a situação para utentes e profissionais de saúde”.
Durante a espera, os doentes passam, dias a fio, com dificuldades em satisfazer as suas necessidades básicas de higiene e alimentação, já que não existem condições para os internar. A título de exemplo, apenas comem bolachas, sopa e leite ou sumos, segundo refere o abaixo assinado de perto de 40 médicos do serviço.
A cada dia que passa, os doentes ficam mais vulneráveis e tendem a desenvolver complicações orgânicas com infeções hospitalares. Face à gravidade da situação, a maioria do corpo clínico do serviço de Psiquiatria já enviou um documento ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra enunciando as carências e as deficiências.
“Nestas condições, estão ultrapassados todos os limites definidos quer pelas normas do serviço quer pelas leges artis que deveriam ser aplicadas ao doente psiquiátrico. A Ordem dos Médicos continua a pugnar pela qualidade da prestação dos cuidados de saúde e considera inaceitável a falta da vagas para internamento de doentes agudos de Psiquiatria. Está em causa a dignidade na assistência destes doentes”, declara o presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos.
Carlos Cortes explica a situação difícil: “A diminuição progressiva do número de camas disponíveis durante os últimos anos atingiu o seu pico no final de 2018 aquando do encerramento da Psiquiatria Mulheres, nos designados Blocos de Celas, por danos ocorridos aquando da tempestade ‘Leslie’. Parte das vagas encerradas foram deslocadas para o Internamento Masculino dos Hospitais da Universidade de Coimbra (no rés-do-chão do bloco central) e para o Pavilhão 2 do Hospital Sobral Cid (no 1º andar, sem elevador), com sobrelotação desses espaços. Desde então, face à carência por vezes grave de camas, há doentes com patologia psiquiátrica que, por permanecerem há demasiado tempo no Serviço de Urgência, são internados noutras enfermarias, sem os devidos cuidados especializados”.
Assume o presidente da SRCOM que este é um “grito de alerta para uma realidade desumana pois resulta em graves consequências para os doentes. O CHUC tinha um centro de referência nacional na área da psiquiatria que está a ser gradualmente destruído. O Conselho de Administração deveria valorizar a excelência do trabalho realizado pelos profissionais na área da saúde mental e não estar a pôr em causa a própria dignidade dos doentes”.
“A ministra da Saúde não pode pactuar com esta grave falta de acesso a cuidados de saúde e a sua gradual desumanização. É urgente devolver vagas de internamento de agudos, pelo menos, em número igual ao existente em 2018 e reverter o grave retrocesso de que é alvo o Serviço de Psiquiatria”, frisa a concluir Carlos Cortes.
Em declarações à agência Lusa, o presidente do CHUC, Fernando Regateiro, rejeitou as críticas e frisou que “só muito excecionalmente” os doentes ficam mais de 24 horas no serviço de urgência e que essas situações, “raras e excecionais, são menos do que os dedos de uma mão”.
“Essas descrições [dos críticos] não correspondem à realidade”, assegurou Fernando Regateiro, adiantando que quem está no serviço de urgência “é porque tem de lá estar”.
Já sobre o regime alimentar denunciado de “bolachas, sopa e leite ou sumos” em que os doentes passam “dias a fio [na urgência], com dificuldades em satisfazer as suas necessidades básicas de higiene e alimentação, já que não existem condições para os internar”, o também especialista em genética médica lembrou que o serviço de urgência “tem um regime alimentar próprio”, diferente do internamento, dada a necessidade de os doentes terem de fazer análises clínicas e outros exames ou mesmo intervenções cirúrgicas.