Várias espécies de anfíbios que vivem nas lagoas da Serra da Estrela, como o sapo-parteiro e o tritão-marmoreado, estão a morrer por causa de uma nova estirpe de vírus, alertou nesta semana um estudo publicado na revista Scientific Reports.
Desde 2011 que estes pequenos animais estão a ser afectados por uma nova estirpe do vírus do género Ranavirus, que afecta outras regiões da Europa. Como o tritão-de-ventre-laranja (Lissotriton boscai). Antes do primeiro surto, em 2011, foram encontrados num charco cerca de 230 animais; em 2014, apenas restavam seis.
“Esta nova estirpe tem sido responsável pela morte anual em massa de várias espécies de anfíbios, semelhante ao que foi registado no Norte de Espanha”, explica em comunicado Gonçalo M. Rosa, biólogo que lidera o trabalho de monitorização dos anfíbios da Serra da Estrela, a decorrer desde 2009.
Os investigadores salientam que este ranavírus é “altamente virulento em múltiplas espécies e estágios de vida, e a diferentes altitudes”.
O problema é que pouco se sabe ainda sobre este grupo de ranavírus.
“Não sabemos como tratar indivíduos com ranavirose, nem como mitigar ainda o problema no campo”, comentou Gonçalo M. Rosa, investigador do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais, DICE (Universidade de Kent) e ZSL (ambos no Reino Unido).
Para saber mais, os investigadores estudam todas as espécies de anfíbios que vivem no Parque Natural da Serra da Estrela, em dez locais, especialmente naqueles onde já foram encontrados animais mortos.
A partir de 2011 concentraram os estudos em Folgosinho, num tanque com 255 metros quadrados a cerca de mil metros de altitude e perto da vila de Folgosinho.
Neste tanque, em Agosto de 2011 foram encontrados os primeiros animais infectados com este ranavírus no Parque Natural da Serra da Estrela. Eram dois tritões-marmoreados (Triturus marmoratus).
Meses depois, em Novembro, os investigadores regressaram ao local e encontraram mais de 92 por cento dos girinos de tritão-de-ventre-laranja mortos, com sinais de ranavirose. Tinham hemorragias na pele e úlceras.
“O mesmo padrão de mortalidade em massa, envolvendo múltiplas espécies de anfíbios, repetiu-se anualmente nas quatro estações do ano em Folgosinho”, escrevem os investigadores no artigo.
Os biólogos recolheram dados nos tanques, munidos de camaroeiros, três a quatro vezes por ano (Primavera, Verão, Outono e, dependendo do clima, no Inverno), durante dois a três dias.
De acordo com os resultados da investigação, por causa desta nova estirpe de vírus, a população de tritão-de-ventre-laranja de Folgosinho caiu 68,8 por cento entre 2011 e 2013.
“Os vírus do género Ranavirus encontram-se um pouco por todo o mundo, sendo capazes de infetar vários grupos de animais, desde peixes a répteis e anfíbios. Mas diferentes estirpes têm diferentes graus de virulência, e aquele que circula na Serra da Estrela pertence a um grupo hiper-virulento chamado CMTV-Ranavirus”, frisam.
Estes vírus estão a expandir-se na Península Ibérica, que alberga grande parte da biodiversidade de anfíbios da Europa, incluindo várias espécies endémicas.
Mas esta já não é a primeira vez que os anfíbios da Serra da Estrela causam preocupação. Em 2009 foram encontradas centenas de sapos-parteiro (Alytes obstetricans) mortos numa das lagoas do Parque Natural.
Os investigadores concluíram tratar-se de uma infecção por quitrídio (Batrachochytrium dendrobatidis), um fungo microscópico que afeta as populações de sapo-parteiro. Tratou-se do primeiro caso de declínio de anfíbios em Portugal associado a uma doença. Em poucos anos, o sapo-parteiro desapareceu de quase 70 por cento dos pontos onde habitava.
Contudo, enquanto os efeitos do quitrídio continuam a estar limitados a altitudes elevadas e a uma única espécie, o ranavírus revela ser altamente virulento em múltiplas espécies e estágios de vida, e a diferentes altitudes. Na verdade, está a provocar declínios e a alterar a composição e a estrutura das populações de anfíbios na Europa.
Texto: wilder.pt