Em Portugal, onde a paixão clubística é exacerbada, a atividade de árbitro de futebol não parece ser uma das mais tranquilas de exercer. Perante todo o ruído que se gera à volta do ganhar ou perder, a atividade de árbitro é algo que poucos, ainda, escolhem como carreira e se arriscam a fazer.
O crescente destaque dado às diferenças clubistas, de investimentos financeiros e outras, minimizando as qualidades técnicas e desportivas que são comuns a todos, cria rivalidades que são exteriores à prática e à competição desportiva e que as descaracterizam.
A formação de árbitros em Portugal é atualmente bastante completa, exigente e com muita qualidade. Os jovens que começam a atividade têm noção de que vivem semanalmente com o primado da competência que constitui uma constante exigência dos atletas, treinadores, dirigentes, comunicação social e adeptos. O trabalho, invisível, que se faz durante a semana é imenso, sendo os jovens preparados nas várias vertentes e constantemente avaliados e escrutinados.
A verdade é que a arbitragem é apaixonante. Permite a prática desportiva (treinos físicos e técnicos) e a participação nas competições desportivas. A arbitragem proporciona a oportunidade de muitos chegarem a estádios míticos e pisarem relvados que fazem parte do imaginário de todos os desportistas. O árbitro é mais um agente desportivo que tem ele próprio competição com os seus pares. Em resumo, a arbitragem tem todas as componentes que os jovens apreciam.
É fundamental promover junto das crianças e jovens que, a partir dos 14 anos, podem tirar o curso e que a arbitragem é uma carreira enriquecedora em termos pessoais, sociais e desportivos. Os pais, há que informá-los de que a arbitragem é uma escola para a cidadania e que, em idade de influências, esta é das positivas. Aqui os jovens aprendem a assumir compromissos e a tomar decisões, que são comportamentos tão importantes para a nossa vida.
“Não conheço nenhum jovem árbitro(a) que tenha seguido o caminho da delinquência. Não conheço nenhum que abuse do álcool ou que consuma regularmente substâncias proibidas. Os jovens árbitros estão sempre a aprender. Aprendem a assumir as consequências das suas decisões, a lidar com a crítica e a gerir emoções. Aprendem a ignorar o insulto, a sancionar o prevaricador e a aplicar a justiça. Aprendem a acertar e a errar. Levam um estilo de vida saudável e disciplinado, que os torna melhores pessoas, melhores seres humanos.” Duarte Gomes, in Expresso de 17/10/2021.
Toda a intervenção do árbitro é, garantidamente, uma intervenção humana. Treinadores, atletas, dirigentes e jornalistas têm de fazer prova da sua correta formação desportiva, devendo ser os primeiros a compreender que os árbitros são humanos e não podem deixar de errar!
Arbitrar não é sancionar de maneira automática, é interpretar – de modo humanamente falível, mas igualmente de modo fundamentado – a verdade de um jogo que, embora sujeito a regras, a cada passo evidencia situações irrepetíveis das circunstâncias, em diferentes contextos, dos agentes e dos desempenhos. Por isso, arbitrar não é assim tão fácil.
A mediatização a que o desporto está sujeito, designadamente na televisão, generalizou um conceito de competição-conflito. Julga-se muito a árvore pela floresta! Transporta-se da televisão para o campo, mesmo que neste estejam crianças ou jovens a jogar e a arbitrar. O árbitro é o primeiro garante da verdade desportiva de uma competição. Assim fossem todos os outros agentes.
Perante tudo isto, só resta aconselhar que os jovens tirem o curso de árbitro e sintam o tão apaixonante que é esta atividade na sua génese. Tão só, e somente isto!
Texto:
Vitor Santos
(Embaixador do PNED)